08 de fevereiro de 2020 – terceira e quarta aulas de Vegetoterapia II

Seguindo o esquema de janeiro, aonde tivemos aula dupla de Análise do Caráter III, agora em fevereiro tivemos aula dupla de Vegetoterapia II. Assim, a Denise iniciou explicando que nessas duas aulas trabalharíamos quatro segmentos: cervical, torácico, diafragmático e abdominal. A partir disso, ela trouxe uma ideia de que haveriam pares funcionais de segmentos de couraça, um conceito criado por Blanca Rosa. O segmento ocular faz par com o segmento abdominal, que “faz a correlação da gestação do bebê com o olhar da mãe e todas as sensações intra-uterinas”; o segmento oral faz par com o segmento pélvico, “que é o lugar do desejo, no bebê, é na amamentação que você estabelece a possibilidade de ser um bom ou uma boa amante, a relação da sucção com o desejo, da experiência do prazer, inclusive uma questão física da articulação pélvica com a articulação mandibular tem uma funcionalidade”; o segmento cervical faz par com o diafragmático, “que está muito ligado à questão da entrega, o controle e a entrega, que é muito importante para o reflexo do orgasmo, assim como a língua, que está ligada ao segmento cervical e tem relação com o engolir”; o segmento torácico seria ímpar, que é onde estão muitos dos órgãos de funções vitais, como o coração e os pulmões. Aqui fica muito evidente a filiação do trabalho corporal com o arcabouço teórico da psicanálise, pois as referências sempre remontam a essencialismos da fase infantil, essa ideia de que o Complexo de Édipo é realmente uma estrutura fundamental da mente humana (ao menos da mente humana da nossa sociedade, quando se chega a essa consideração), o axioma de que as experiências infantis determinam de forma direta e inequívoca a formação da personalidade, ou do caráter, das pessoas. Como sempre tento colocar, não se trata de negar a influência das experiências totais da pessoa na formação da sua personalidade; mas, pelo contrário, a questão é entender que não há fase determinante para isso ou aquilo, e que afirmações como “é na amamentação que você estabelece a possibilidade de ser um bom ou uma boa amante” deveriam ser olhadas com muita desconfiança – mas, ao contrário disso, ao menos no que posso observar na formação, são aceitas como verdades inquestionáveis. Eu realmente gostaria de poder viver em um mundo aonde as pessoas entendessem que ser um bom ou uma boa amante se relaciona com uma quantidade grande de variáveis e, assim, dificilmente poderia ser atribuído a uma única fonte – ainda mais a uma tão questionável como essa.

Depois disso, por conta de uma pergunta de uma pessoa, entramos em uma conversa sobre labirintite que me interessou muito, tanto por conta da questão em si da labirintite quanto pela afirmação da Denise de que essa é uma doença/disfunção que pode ser trabalhada com perspectiva de melhorias na clínica. Acho interessante relatar isso para reforçar que não sou o “do contra”, pois essa foi uma questão que achei muito interessante de ver discutida. A pessoa que fez a pergunta mesmo disse que recentemente começou a ter crises de labirintite, que só descobriu se tratar disso quando foi ao médico depois de uma semana com tonturas que atribuía a outros fatores (como não estar se alimentando corretamente, por exemplo), e que fazendo os exames não foi detectada nenhuma causa física, então lhe foi atribuída uma origem de fundo emocional; mas o mesmo remédio que é usado em causa de origem física foi lhe receitado, e ela relatou melhoras ao passar a utilizar a medicação. A Denise também relatou que uma vez teve uma crise de labirintite, e que para ela estava clara a ligação emocional que isso tinha com o falecimento recente de sua mãe, tanto que não teve crises antes nem depois desse episódio – e o remédio que tomou foi o mesmo. Alguém pesquisou lá na hora e descobriu que o tal remédio influencia com receptores de cálcio do organismo, e eu não faço muita ideia do que já sabemos dessa relação do cálcio com o labirinto, de como se chegou a esse remédio e das pesquisas na área; mas certamente deve ser um campo bem interessante de se aprofundar, principalmente fazendo um recorte a partir desse dado de que pessoas possuem crises de labirintite a partir de causas distintas, diretamente físicas e diretamente emocionais. Uma pessoa da minha família também teve crises muito agudas de labirintite que “coincidiam” (aspas pois, com essas novas informações, fica difícil atribuir a uma coincidência e mais certo entender uma relação de causalidade) com um período de luto e sofrimento psíquico. Essa é uma concepção de Reich que me atraiu, a ideia de que corpo e mente não podem ser entendidos como coisas separadas, mas sim formam uma unidade funcional; assim, uma coisa tão subjetiva quanto o luto pode causar um distúrbio em algo tão material quanto o ouvido interno, a ponto de ser tratado com um fármaco que age nos receptores de cálcio do organismo. Pesquisar se a relação se inverte seria de muito interesse, acredito, para aprofundarmos nosso conhecimento do funcionamento do organismo humano: em uma pessoa que desenvolve uma crise de labirintite por conta de questões psíquicas/emocionais, tratar das manifestações físicas dessa questão ajuda de alguma forma no aspecto subjetivo do sofrimento enfrentado? A labirintite se afigura como reflexo de um processo doloroso de luto; tratar a labirintite ajuda de alguma forma a lidar com luto? Claro que essas coisas não se darão de uma forma linear e inequívoca, mas com uma pesquisa rigorosa nesse sentido talvez possamos compreender melhor fragmentos do nosso funcionamento biopsíquico. Segundo a Denise, Freud fala em seu artigo “Luto e Melancolia” que seriam necessários dois anos para a resolução de uma situação de luto; embora eu seja bastante crítico de Freud e não tome todas as suas construções como verdade, não deixa de ser espantoso que alguém que se debruçou sobre o tema fale em dois anos (eu não conheço o artigo, mas imagino que ele esteja se referindo a dois anos acompanhados do processo terapêutico) e a nossa sociedade questione até a necessidade de faltar a um dia de trabalho no caso de morte de um ente querido, e cada vez vamos para a medicalização dos diversos aspectos da vida, com as pessoas não tendo nem um tempo para lidar com tal perda – está triste, é “transtorno depressivo” (ou algo que o valha), tome um antidepressivo e volte a trabalhar. Uma obra que aborda isso de forma rasa mas interessante é a série “Go On”, que só teve uma temporada e eu recomendo fortemente; nela acompanhamos um trecho da vida de Ryan King, um radialista de esportes que acaba de perder a sua esposa, falecida em um acidente de carro, e que para voltar ao trabalho precisa fazer algumas sessões de terapia. É uma série de comédia que não busca ir muito profundo nas questões, tem grandes problemas no roteiro, mas apresenta situações com as quais, acredito, muitas pessoas poderão facilmente se identificar, e muitas delas se dão em torno do personagem principal e sua passagem pelo processo de luto.

Na parte do trabalho corporal, a Denise disse que trabalharíamos o segmento cervical e o torácico através do reflexo do vômito. Ao pedir uma pessoa como voluntária para fazer a demonstração, a pessoa que foi estava de calça jeans, e a Denise já havia dito na reunião de formação da turma e reforçado na primeira aula que as pessoas deveriam ir com roupas mais confortáveis, advertindo diretamente contra a calça jeans, por “prender muito” e ser um tecido duro. Acredito que a pessoa não se recordava disso ao deitar no colchonete, pois a Denise perguntou “…aquilo que eu pedi: e a roupa?” e a pessoa respondeu “a roupa vai continuar”, imagino que por conta da Denise ser uma das pessoas da coordenação que fala muito do trabalho sem roupa, o que provocou uma risada geral. Aí a Denise já trabalhou a partir disso, perguntando “o que será que significa esquecer e vir de jeans?”; só na elaboração dessa pergunta já se pode detectar uma filiação com essas concepções psicologizantes de que “tudo significa alguma coisa mais profunda” – e nesses casos sempre gosto de lembrar que mesmo Freud, tão afeito aos determinismos e psicologismos como era, marcou que “às vezes um charuto é só um charuto”. É importante notar, claro, a construção frasal do próprio Freud: “às vezes”; embora não seja explicitamente colocado, dizer que algo acontece “às vezes” de certa forma geralmente indica que tal coisa acontece assim numa minoria de situações, sendo mais comum o acontecimento da(s) alternativa(s). Nesse exemplo freudiano, então, poderíamos dizer que “muitas vezes um charuto é mais do que um charuto”; pensando dessa forma, então, creio não ser difícil perceber o motivo da necessidade que vejo de, ao estudar Freud (e suas derivações), manter a desconfiança em alerta. Penso que eu poderia ser acusado de implicância ou de leitura enviesada por fazer tantas ressalvas por conta de uma frase que, efetivamente, poderia estar coberta de razão para existir; claro, efetivamente poderia ser que, dados os avisos da Denise em relação à vestimenta a pessoa tivesse algum motivo específico para ignorar isso e vir justamente com uma calça jeans, que obviamente atrapalharia qualquer trabalho corporal a ser desenvolvido e que dependesse de maior movimentação ou mesmo observação das pernas. A própria resposta da pessoa também foi atravessada por esse olhar, e aqui, mais uma vez, penso que isso se deve mais a um viés de confirmação (é uma tendência geral das pessoas que procuram a formação o pensar dentro ou próximo desses determinismos, e essa pessoa em particular estuda a teoria reichiana desde antes da formação) do que a uma análise cuidadosa dos seus motivos e questões internos; essa minha impressão tem muito da leitura que faço do contexto, tanto de uma forma mais estendida (pensando as experiências que tive na formação como um todo) quanto do que presenciei ali do dia, as pausas na fala, as respostas em tom de pergunta como que buscando atender a uma expectativa, a expressão corporal… Mas, enfim, ao responder à questão da Denise (“o que será que significa esquecer e vir de jeans?”) a pessoa disse “Medo, né?” – será que essa pessoa realmente sentiu medo ao escolher uma calça jeans, ou mesmo percebeu naquele momento que foi medo que lhe levou a essa escolha? Novamente, se tivesse sido assim, haveria necessidade de colocar a sua resposta como pergunta, buscando confirmação. Houveram alguns curtos comentários sobre a forma como essa pessoa respondeu e à contradição de ela estar com medo e mesmo assim ter se oferecido como voluntária para a demonstração, mas o que achei mais interessante e que se afigurou muito importante em toda a leitura e interpretação que fiz de tudo o que se seguiu foi a frase que ela disse logo depois: “Já posso chorar? (…) Denise olha pra gente já vem o choro”. Certamente, como foi analisado depois, essa frase demonstra que há um processo forte de transferência estabelecido dessa pessoa para com a Denise; afinal, ela não estava nem há dois minutos deitada ali e já sentia a necessidade de chorar só de trocar olhares com a Denise – dificilmente isso poderia ser atribuído só àquela troca, algo estava sendo trazido “de outro lugar” e colocado naquela relação. Mas também existe toda uma “aura” em torno da Denise em relação à qualidade do seu trabalho corporal e à sua sensibilidade; percebam, eu em momento algum estou dizendo que essa “aura” (me falta uma palavra melhor, não estou me referindo a nada “místico” ou sobrenatural, mas aos comentários e impressões que se fazem) é indevida ou exagerada, pelo contrário, eu mesmo já presenciei ela atuando corporalmente em uma aluna durante um intervalo e, somente a partir de uma única intervenção produzir visível alívio e melhoria na condição da pessoa, o tipo de coisa que, acredito, só se consegue com muito estudo e experiência acumulada. No entanto, também é inegável que essa “aura”, mesmo tendo origem em fatos, ajuda e potencializa no viés de confirmação que já existe na formação, de forma quase tangível mesmo. Assim, por mais experiência, estudo e qualidade no trabalho corporal que alguém possa ter, acredito que dificilmente pode-se atribuir a isso um comportamento como esse, de apenas com uma troca de olhar surgir a vontade de chorar; algo já estava a ponto de transbordar nessa pessoa, e a sua crença na capacidade do trabalho reichiano de extrair das pessoas emoções profundas encontrou na Denise uma materialização perfeita. Descrever todo o resto do trabalho corporal que foi feito com essa pessoa acabaria por alongar muito o relato, e acredito que apenas esses primeiros pares de minutos já trazem material suficiente para uma reflexão interessante.

Depois da demostração com essa pessoa, fizemos um pequeno intervalo e a Denise pediu que outra se voluntariasse. Logo no início do trabalho a Denise deu apertões doloridos (segundo a expressão da própria pessoa), e fez perguntas no mesmo tom psicologizante, trazendo a ideia de que ao movimentar o corpo lateralmente, se esquivando dos apertões, a pessoa estava “fugindo de alguma coisa” – não está óbvio que ela está fugindo da sensação de dor? Eu compreendo que se concordamos com Reich na ideia da couraça muscular, certamente um trabalho de intervenção nessa couraça poderá provocar dor; mas também há certos limites do óbvio que vejo ultrapassados em nome dessa concepção essencialista e psicologizantes que permeia por ali – um beliscão, aplicado com quantidade significativa de força, irá doer e ponto. Algumas pessoas podem sentir mais essa dor, outras menos, certas estruturas podem sentir dor com menor ou maior aplicação de força, a forma de se pegar no músculo e o tamanho desse irão influenciar no quando e quanto a pessoa irá sentir de dor, certamente existem outras variáveis que eu esqueci e tantas outras que eu nem faço ideia que influenciam diretamente nisso; mas ao beliscar com força um músculo ou grupo muscular pequeno, certamente a probabilidade de provocar dor é grande, seja a pessoa o quão “desbloqueada” ela for. É uma questão física que vejo quase sempre ser ignorada por lá nesse tipo de exercício; se eu te belisco e dói, certamente é porque você possui algum bloqueio ali – o fato da dor ser uma resposta normal de um organismo humano nem parece passar pela cabeça das pessoas. Se passasse, fugir da dor não seria necessariamente levado para um lado de interpretações psicologizantes do tipo “você está fugindo de alguma coisa”. Inclusive eu perguntei sobre isso enquanto a Denise fazia a demonstração com essa pessoa, pois na primeira pessoa ela disse que era importante a manifestação do “não”, enquanto que com essa segunda pessoa a Denise insistia nos movimentos mesmo a pessoa ativamente tirando a mão dela. Ela não me respondeu diretamente, apenas dizendo um “eu não estou obrigando a nada” quando eu fiz essa afirmação, claramente ignorando o contexto e as relações de poder que se estabelecem ali; afinal, se a pessoa tomasse uma atitude mais enérgica em relação a ser machucada, imagino que já existiriam interpretações psicanalíticas prontas a serem apresentadas: caso a pessoa se levantasse, estaria fugindo de alguma coisa, e se segurasse com mais vigor as mãos que lhe machucavam, ou mesmo se batesse em resposta, teria alguma atitude sádica naquela resposta – e, não hajam dúvidas, todas essas respostas poderiam levar a interpretações sobre a infância dessa pessoa e da sua vontade de matar o pai para comer a mãe.

Depois disso fizemos o exercício em duplas, trabalhando inicialmente um “afrouxamento” dos segmentos superiores e depois trabalhando diretamente o reflexo do vômito, colocando o dedo na garganta da outra pessoa. Esse sempre foi um trabalho que eu tive curiosidade de fazer, pois é colocado pelas pessoas como muito intenso, pesado, então havia essa curiosidade sobre como a coisa iria se processar. Não achei nada demais no trabalho, seja induzindo o reflexo na outra pessoa ou tendo eu o reflexo do vômito; realmente pude sentir como no momento que o reflexo de vomitar vem o corpo todo se envolve no movimento, o pulsar do diafragma é muito perceptível. Mas nada para além disso, nenhuma reação emocional forte, e isso na turma toda, não só na minha dupla.

Na segunda parte da aula, a Denise iniciou fazendo algumas considerações sobre o trabalho corporal, reforçando a importância da terapeuta ter liberdade no trabalho com o corpo da paciente e com o seu, e trazendo algumas questões sobre o segmento abdominal. Não houveram grandes questões levantadas nem pontos que eu achasse interessantes, falou-se bastante sobre o funcionamento dos intestinos e da sua importância para a nossa saúde; aqui, só uma coisa que eu achei pertinente de registrar, foi interessante ver como uma pessoa trouxe um argumento desenvolvido pela neurociência de que os intestinos e seu funcionamento tem relação direta com processos mentais, e como isso vai ao encontro do que se discute dentro da teoria reichiana, ninguém levantou discordância e, pelo contrário, pareceram apreciar que um campo de pesquisa científico confirmasse algo da teoria reichiana. O interessante é ver como existe uma valoração de conveniência aos campos do conhecimento e seus discursos, enunciados e postulados; outras vezes já pude observar lá o comportamento contrário, de alguma pesquisa ou informação vinda de dentro do campo da ciência ser usada para discordar ou mesmo questionar alguma afirmação sustentada dentro do campo reichiano e isso ser mal recebido, geralmente com comentários depreciativos à prática institucionalizada da ciência (que tem mais é que ser criticada mesmo, mas não podemos tomar o efeito pela causa). A primeira coisa nesse sentido que observei lá, inclusive, veio diretamente do campo da neurociência, pois tínhamos uma companheira de curso que vinha dessa área, e questionou (em tom de pergunta mesmo, pois ela parecia bem interessada e afinada com a teoria reichiana) sobre como as recentes descobertas do campo da neurociência estavam sendo utilizadas pelo campo reichiano para avaliar as suas hipóteses, axiomas e pressupostos; a questão dela tinha que ver com a amnésia infantil e a descoberta do processo de poda neural. Quero deixar explícito e reforçado aqui que não vejo nenhum problema em alguém questionar pontos e afirmações vindos de um campo e aceitar outros, isso é algo completamente possível de se fazer de uma forma coerente e responsável; o que questiono e acho interessante observar indícios nesses episódios observados no IFP é esse comportamento feito de forma não coerente (ao menos no que posso observar). Primeiro e mais importante, é patente como ali não há uma preocupação com a construção do conhecimento a partir do método científico; assim, não vejo como pode fazer sentido concordar com uma afirmação feita dentro do campo da ciência – se você não entende ou valoriza o método pelo qual uma informação foi obtida, como você pode valorizar a informação em si?

O trabalho corporal dessa aula foi mais simples e menos direcionado, embora tenha acontecido algo interessante na demonstração que a Denise fez. Logo que a primeira pessoa que se voluntariou para a demonstração do trabalho corporal deitou no colchonete, a Denise perguntou “e essa roupa?”, se referindo ao fato da pessoa estar com calça jeans, uma vestimenta que ela já tinha pedido que as pessoas não utilizassem para as aulas, pedindo que fôssemos com roupas confortáveis e que expusessem o máximo do corpo possível; a essa pergunta a pessoa respondeu prontamente “a roupa fica”, acredito que tendo entendido que a questão da Denise era referente a tirar a roupa, pois ela trás muito essa discussão sobre o trabalho corporal sem roupa. Isso gerou algumas risadas, e desfeito o desentendimento, a Denise iniciou um diálogo com a pessoa para começar o trabalho corporal; nesse pequeno diálogo inicial a pessoa já demonstrou uma projeção forte de algumas coisas, que não vou ficar desenvolvendo muito aqui nesse relato que já está bem extenso – mas para colocar uma bem significativa, em um momento de silêncio entre as duas a pessoa disse algo como “só de olhar pra Denise a gente já fica com vontade de chorar”. A partir disso, o trabalho foi desenvolvendo rapidamente para a Denise demonstrar em como a pessoa estava com muito medo, e realmente algumas coisas eram bem visíveis (a tensão no corpo, o exitamento nas respostas, os movimentos das mãos – a única coisa que eu não pude reparar com detalhe mas do pouco que vi discordei da observação da Denise foi ela dizer que as pupilas da pessoa estavam dilatadas); assim, como o objetivo da Denise era mostrar o trabalho com os segmentos diafragmático e abdominal, ela disse que não poderia demonstrar com essa pessoa, visto a necessidade de trabalhar com ela o segmento ocular (ao qual estaria relacionado o sentimento do medo). Essa é uma situação que levanta várias possibilidades de debate e aprofundamento, tanta pela questão evidente de que havia uma questão emocional ali se colocando e evidenciando a relação corpo e mente, soma e psiquê, quanto também mais um exemplo para se discutir vieses cognitivos e essas coisas que venho discutindo nos relatos.

Depois outra pessoa se voluntariou para a demonstração, e o trabalho que a Denise demonstrou não teve nada de específico, apenas uma observação geral da respiração da pessoa, buscando detectar bloqueios a partir do ideal de respiração saudável que defendem lá (uma respiração sincronizada entre abdômen, peitoral e laterais, com a expiração mais rápida do que a inspiração, uma pequena pausa entre a inspiração e a expiração, e uma pausa maior entre a expiração e uma nova inspiração). Depois disso, ela nos pediu para formar duplas e fazer um trabalho com essa ideia, de trabalhar em cima de bloqueios que detectássemos na pessoa, mas iniciando dos segmentos superiores e descendo. Como o tempo foi curto e o trabalho pouco direcionado, não houve muita coisa que eu possa relatar; isso não significa que o trabalho não foi interessante, pois é geralmente uma experiência interessante poder fazer esse tipo de intervenção tendo uma pessoa experiente para tirar dúvidas e direcionar-nos no caso de ficarmos perdidos. A questão é que o ganho é muito mais subjetivo do que mensurável, acredito que acumula em nossas experiências e, a partir disso, vamos construindo a nossa prática e corpo terapêutico.